Maria Teresa Horta e Dilma Rousseff: simpósio Internacional reúne dois ícones mundiais em conferência no Cidec-Sul

O 2º Simpósio Internacional de História, Cultura e Relações de poder “História, Política e Cultura no Mundo Lusófono” mobilizou público expressivo no Cidec-Sul na segunda-feira, 4. Voltado à vida e obra de Maria Teresa Horta, o evento colocou em debate o mundo lusófono, com questões de arte, literatura e cultura femininas nas primeiras mesas-redondas. O professor António Costa Pinto, da Universidade de Lisboa, proferiu a conferência de abertura, às 17h, e em seguida, uma plateia de mais de 800 pessoas assistiu a conferência da ex-presidenta Dilma Rousseff, que apresentou uma perspectiva sobre o país na atualidade. Dilma foi recebida pela professora da FURG e organizadora do evento, Michelle Vasconcelos, com cravos vermelhos e um poema inédito de Horta em sua homenagem.

“Liberdade”, o poema recitado por Michelle Vasconcelos, aproximou no palco dois ícones de Portugal e Brasil na luta por democracia e igualdade. “Para Dilma Rousseff, com toda minha admiração pela mulher e a lutadora política, corajosa e determinada que sempre foi e é, este poema escrito na vã tentativa de substituir o meu enorme abraço de admiração que lhe daria, Dilma, se aí estivesse presente”, dedicou a poeta portuguesa. Na mesa de honra estavam o prefeito municipal, Alexandre Lindenmeyer, o reitor em exercício, Danilo Giroldo, a diretora do Instituto de Ciências Humanas e da Informação da FURG (ICHI), professora Derocina Sosa, o coordenador dos cursos de História da FURG, professor Rodrigo de Oliveira, e Michelle Vasconcelos.

Para Danilo Giroldo, a participação de Dilma Rousseff no simpósio, na FURG e neste momento, é um símbolo importante porque toda a política industrial recente, que sinalizava ter entre os principais objetivos distribuir tanto renda quanto riqueza, passou pelo olhar e pelo pensamento da ex-presidenta. Em conexão com essa proposta de país, “é por isso que a universidade se envolve tanto nos processos de inovação tecnológica, de trabalho em conjunto com as empresas pequenas e médias, com a formação de novas empresas, porque esse é um processo de distribuição de renda e de distribuição de riqueza que nós vivemos nesse município e é fruto de uma política industrial”, considerou o vice-reitor. “País sem indústria não tem futuro, assim como um país sem história não pode avaliar suas políticas públicas”, finalizou.

“A minha palestra só pode ser sobre o Brasil de hoje. Seria estranho se eu falasse sobre qualquer outra coisa. Dia 31 de agosto, um ano decorreu desde que um golpe parlamentar-judicial foi dado no Brasil”, disse Dilma, dando início à conferência em que durante quase uma hora e meia descreveu, explicou e avaliou o processo político em curso desde seu afastamento da presidência da república e fez projeções sobre o país em relação à proximidade do período eleitoral de 2018. Democracia, participação, educação, resistência: tônicas da fala de Dilma Rousseff. Temas caros ao contexto da cidade do Rio Grande, como os rumos do polo naval e os contingenciamentos orçamentários em nível federal para a região sul não ficaram de fora da pauta da ex-presidenta.

 

“O que se mostra é uma outra visão”

Dilma Rousseff foi didática ao abordar o que considera fragilidade da estrutura democrática brasileira, apontando nós, sobretudo os econômicos, que precisam ser afrouxados. As ligações de outras épocas da história do país com o projeto ideológico de nação em andamento ajudam a compreender e inclusive antever, segundo ela, a conturbada cena nacional e seus próximos desdobramentos. O caminho neoliberalista de estado, políticas sociais e garantias de investimentos público e privado mínimos e de privatizações e desregulamentações máximas é incompatível, por exemplo, com a indústria naval que o município vê agonizar.

O investimento em indústria naval da gestão Dilma buscou estimular empregos com maior valor agregado. “A gente definiu que tudo o que podia ser produzido no Brasil, seria produzido no Brasil, com preço, prazo e qualidade. Mas você chega ao preço, prazo e qualidade cumprindo uma curva de aprendizado. O nível de formação que nós tivemos até 2003 não permitia isso. Então, tinha de criar conteúdo local, sim. Todos eles [países desenvolvidos como Noruega e Inglaterra] criaram conteúdo local. Você não faz só conteúdo local ou importa, faz os dois. Até porque ao importar você incentiva o conteúdo local, você vai integrar peças, você coloca a gente na cadeia internacional, era isso o que estava sendo feito aqui [em Rio Grande]”, explicou.

Agravidade da situação do polo de Rio Grande expressa, segundo Dilma, descompromisso com o crescimento da nação. “O ERG 1 eu vi nascer da areia. E é o que tinha maior tecnologia. Fazer dois FPSO [do inglês, Unidade flutuante de produção, armazenamento e transferência] juntos era uma vitória do país. Implica numa tecnologia, num nível de precisão”, relatou. “O que se mostra é uma outra visão”, não ineficiência. “Aqui tinha uma cadeia produtiva começando”, frisou.

Educação e resistência

Estimular acesso amplo à educação é necessário e estratégico para o desenvolvimento do país por dois motivos, explicou Dilma: primeiro, porque diminui a desigualdade social e pereniza os ganhos de distribuição de renda e riqueza, eleva a parte mais pobre do Brasil a outro patamar; e segundo, porque é o caminho para qualificar ciência, tecnologia e inovação. Na avaliação da ex-presidenta, as políticas de cotas para acesso ao ensino superior e o programa Ciência sem Fronteiras dão exemplos disso e suas estatísticas são o termômetro do investimento do país nessa direção.

A conferência é uma longa e densa leitura do jogo político que, afinal, aposta em tempos mais conciliadores: “acho que eles não conseguiram desmontar tudo. Há possibilidade de a gente reverter, consertar e andar para a frente. Há a possibilidade de fazer o Brasil se encontrar e diminuir esse nível de intolerância que se criou entre nós. E há a possibilidade de a gente reconstruir o nosso país, mas a gente precisa de participar”, falou, a respeito da urgência de ampliação dos espaços democráticos como o que o simpósio representa. E “resistam”, encerrou.

A conferência de Dilma Roussef foi transmitida ao vivo pela FURG TV, nos canais 15 da NET (digital), 6 (analógico) e 7 da Blue, e pela página da universidade no Facebook, onde o conteúdo está disponível na íntegra. O 2º Simpósio Internacional de História, Cultura e Relações de poder “História, Política e Cultura no Mundo Lusófono” vai até esta quarta-feira, 6, com mesas redondas, conferências, simpósios temáticos, simpósios de iniciação científica, oficinas, exposição e lançamento de livros, e termina com a Conferência de encerramento do professor José Rivair Macedo, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

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